quarta-feira, 15 de agosto de 2012

A duração da vida
(Um conto dos Irmãos Grimm - Jacob & Wilhelm Grimm)

Quando Deus criou o mundo e ia fixar a duração da vida de cada criatura, o asno perguntou-lhe:
- Qual será a duração da minha vida, Senhor?
- Trinta anos - respondeu o Padre Eterno. - Estás contente?
- É muito tempo, Senhor - respondeu o asno. Lembra-te de quanto é penosa a minha vida! Transportar cargas pesadas de manhã à noite, levar sacos de trigo ao moinho para que os outros possam comer pão, não receber outras carícias senão as do freio e do chicote. Por piedade, Senhor, poupa-me de uma parte ao menos dessa vida tão cruel!
 Então, o Senhor teve piedado do asno e cortou dezoito anos em sua vida.
O asno se retirou, agradecido a Deus, e o cão apareceu então.
- Quantos anos gostarias de viver? - perguntou-lhe o Onipotente - Trinta anos são demais para o asno, mas, para ti devem ser satisfatórios.
- É esse o teu desejo, Senhor? - replicou o cão. - Lembra-te que tenho de correr, mas as minhas pernas não resistem tanto tempo, perco a minha voz para latir e os meus dentes para morder. Só me resta ficar deitado em um canto, rosnando. 
 Deus achou que o cachorro tinha razão e cortou doze anos de sua vida.
 Chegou a vez do macaco.
-Sem dúvida - disse Deus - estás muito satisfeito em viver trinta anos. Não é mesmo? Não precisas trabalhar, vives te divertindo...
- Pode parecer que assim seja, Senhor, mas, na verdade, é bem diferente. Os homens acham graça em mim, é verdade. Mas isso não quer dizer que tal coisa me seja agradável. Sinto-me ridículo, desprezado. A minha vida aprece muito longa.
- Está bem - condescendeu o Padre Eterno. - Não seja essa dúvida. Vou tirar dez anos da tua vida. 
 Afinal, apareceu o homem, alegre, saudável e vigoroso, e pediu a Deus que fixasse a duração de sua vida.
- Viverás trinta anos - disse o Senhor. - Estás satisfeito?
- É muito pouco tempo! - retrucou o homem. - Vou morrer logo que tenha construído minha casa, estabelecido o meu lar, plantado as minhas árvores e esteja em condições de gozar a vida? Por piedade, Senhor, aumenta a duração da minha vida!
- Está bem - disse Deus. - Vou te dar os dezoito anos que tirei do asno.
- É pouco, Senhor - replicou o homem.
- Então terás mais os doze anos do cachorro.
- Ainda é pouco, Senhor.
- Pois então eu te darei ainda os dez anos que tirei do macaco, e só. Nem um ano mais!
 Assim, o homem passou a viver setenta anos. Os trinta primeiros correspondem à vida humana, e passam bem depressa. Então, ele é saudável, alegre, trabalha com prazer e vive satisfeito. Segue então os dezoito anos de vida asinina, quando tem de enfrentar encargo após encargo, carregar trigo para os outros comerem o pão, receber censuras e grosserias como paga de seus esforços e de seu trabalho. Depois, vêm os anos caninos, quando ele se encosta, cansado, a um canto, resmunga, sem forças para agir, sem dentes para mastigar. E finalmente, vem a fase simiesca. Abatido, fraco, perdendo a memória, perdendo a inteligência, o homem se torna chacota dos jovens.         

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